sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Manual para comer uma pinha


Comer pinha é uma arte. Pinha, também conhecida como fruta do conde, cabeça de boi ou coração de negro. Porque do conde, do boi ou do negro, isso é outra história. Voltemos ao que interessa. Regra número um, antemão de qualquer ato é a consciência. É de extrema importância ter sempre em mente a particularidade desta fruta. Pinha não é melancia, que se morde e se esvai, se autodelicia. Não. A Pinha pede para ser deliciada. E cuidadosamente. Posto isso, deixemos claro o segundo passo: pinha dispensa facas, garfos e demais talheres ponteagudos. A delicadeza vem das mãos que a separa em metades. Eu disse met-ades. Estraçalhar a pinha em mil caroços é comparável ao pecado de se poupar às cascas de uma uva. Não tem perdão. Partida ao meio, a beleza se mostra: uma média de sessenta longos caroços cobertos com fina camada branca e mole, levemente adocicada. Oh, o paraíso mora aí! Terceira regra: A contemplação. Nada de se esbaforir. Uma pinha pede calma. Após segundos de observação, pegue uma colher e atente para não enchê-la – de três a quatro caroços. Cinco, no máximo, somente para os profissionais da área.  Agora sim, o quinto e mais habilidoso passo: A separação. Prense o caroço entre a língua e o céu da boca. Com sutil movimento, use a língua para retirar a fina camada de frutose que envolve a negra e oval semente.  O movimento é sexy- e seguro: ida e vinda, até rompermos a fina camada por completo.  Atenção! É preciso ter cuidado para não se deixar levar pelo êxtase momentâneo. Para isso, atente à sexta regra: antes de sugar a doce camada goela adentro, separe, na cavidade bucal, as partículas sólidas, pretas e alongadas, que lá restam: as sementes. O canto inferior entre a arcada lateral e a bochecha é um local aconselhável para guarda-las. Feito isto, pode-se engolir com segurança o doce macio que há muito pede para ser devorado. Último passo: Cuspa, sem muita empolgação, os negros caroços na palma da mão. Ainda que os una em um monte na fria superfície de um prato, não se esqueça da sétima e mais importante de todas as regras: Jogue-os em terra fértil, agradecendo e pedindo para que cresçam firmes e doces novamente.

Contraindicação: Àqueles que sofrem de pressa, pouca paciência ou excesso de classe.

Efeitos colaterais: Apetite insaciável. Desejo de quero mais.

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