eu nunca... nunca!... nunca na minha vida fique tão
tão... eu nunca caí
tão fundo
nunca derrubei a casa dessa forma com tanta vontade e falta
(de vontade
tão contrariada porque quando a casa cai,
cai junto tanta coisa
caem os pratos, os livros, caem os espelhos, as paredes começam
a se desfazer
e coisas minúsculas caem também
coisas que você nem vai mais de tanto olhar pra elas... sabe?
como as conchinhas. aquelas conchinhas trazidas dos dias de mar.
aquelas conchinhas, tão bonitinhas, que o vento esculpiu minuciosamente
sabe-se lá durante quantas pencas de anos
conchinhas de todas as cores onde eu via rostos eu via
verdadeiros desenhos, formas mesmo, sabe
eu via nas conchinhas, casas inteiras
um pé de alface verdinho, uma horta, não, não... uma agro-floresta! eu via A floresta
da Amazônia e tudo respirando
um mundo inteiro vivo eu via nas conchinhas como algumas pessoas vêem nas nuvens
isso tem um nome
não é uma doença!
é uma ca-pa-ci-da-de
uma capacidade de abstração: focar e desfocar
poder olhar pra uma coisa e projetar outra.
sabe como é?
a capacidade de ter o futuro dentro dos olhos
fora dos olhos,
caindo sob meus pés,
as conchinhas voltam a ser areia
depois de tanto tempo
as conchinhas voltam a sua condição primeira: minúsculos grãos de areia
areia, areia... areiaareiaareia. areia por todos os lados areia
caindo pelo teto
areia entrando pelas janelas
areia areia areia
areia soterrando tudo
como uma ampuleta que, decidida a interromper a contagem do tempo, quebra:
ela diz:
chega, podemos parar por aqui.
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