quinta-feira, 10 de setembro de 2015
setembro dia 10
Da série memórias vivas dentro da gente. No ano de 2001 me mudei. De colégio, de casa, de bairro. Saí de Vila Isabel, bairro onde cresci, num apartamento de 70 metros quadrados em que o pouco espaço físico era compensado pela sobra de afeto. Tivemos tartarugas, hamsters, passarinho, o Neto, e volta e meio um filhote de pastor alemão, que nos fazia companhia durante uma semana até ir para o sítio, em Friburgo. Nesse prédio moravam todos os amigos. A Clara, que era irmã do Pedro e viria a ser também irmã da Luiza, era minha melhor amiga. Era comum eu descer um lance de escada levando um travesseiro e na fronha meu pijama e uma escova de dente pra dormir na casa dela, enquanto o Pedro subia do 501 pro 602–ele e meu irmão também eram amigos-irmãos. O prédio da Maxwell cresceu junto, as mães eram grávidas juntas e nós, as crianças, pela lei natural do tempo e dos encontros, também erámos um bando que crescia junto. Erámos muitas. E o play, nosso reino. Era queimado, pique-cola, pique-esconde, pique-alto, pique-tudo. Lembro que na fase dos tabuleiros –que pra mim continua até hoje- a onda era o jogo do Pokémon. Devia ser equivalente a War. Um, porque era um vício e, dois, porque virava uma guerra mesmo; um virava o tabuleiro e outro sempre virava o Charmander, ou a evolução da evolução dele. Nesse prédio tinha também a Dona Dalgisa, que morava no primeiro andar, na parte dos fundos, dando direto pra piscina. Costumava chover balinhas de caramelo –daquelas de embalagem transparente que não à toa tem gosto de infância- da janela dela. A Dona Dalgisa era a nossa alegria, mas desconfio que a gente era a dela também. E tinha essa piscina que hoje não chega na minha costela e que onde eu já tive a certeza de viver um tubarão. No horário de verão, dava tempo de voltar do colégio correndo para um mergulho de fim de tarde/ início de noite. Tinha também um porteiro loucamente apaixonado pelo Bangu – tanto que me esqueci o nome dele, mas o time não esqueço. Lembro que eu adorava descascar a tinta azul que cobria a caixa de correspondências e esse prazer de saber estar fazendo coisa errada. Uma distraía o porteiro, enquanto a outra arrancava a tinta –começávamos sempre pelos apartamentos dos que considerávamos menos merecedores do nosso carinho. Uma vez fomos pegas no flagra. Não paramos. Tinha a Mari, que os dois anos de diferença já eram o suficiente pra fazer dela alvo certeiro e amado das nossas brincadeiras. Fernandinha e a Fernandona. Tinha a Martinha, que era menor do que eu e com o cabelo até à cintura –diziam as más– provalvemente nossas- línguas que era promessa da mãe dela. Na copa do mundo de 98, nos reunimos todos no 602 pra ver o jogo do Brasil e picar papel. Mais pra picar papel do que pra ver o jogo do Brasil. Eu queria muito que ele ganhasse pra poder jogar todo aquele papel picado pela janela. Na dúvida, cada gol, cada pênaulti, cada falta a favor –contra também- a gente jogava um pouquinho. É engraçado o jeito como as memórias se desenrolam à medida que a gente vai lembrando delas. Acho que tudo é um pouco assim: vai, se a gente dá corda, se acredita; Foram dez bons anos de vida atenta entregue e compartilhada. Olhar de criança tem dessas facilidades. É bom lembrar pra não esquecer.
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